Rafael Nassif
Na obra premiada de Rafael Nassif, o tecido composicional ora desvela, ora encobre a trama, articulado de modo a provocar a fantasia do ouvinte. A partir do coro de trompas, cuja estabilidade harmônica é submetida a sutis perturbações tímbricas, são esboçadas paisagens, atmosferas, delineando um percurso que se conclui em uma plaga de cristal. Mas a transmutação sonora é orgânica, não mera roupagem, e participa de uma onda sonora que se assemelha a uma vasta ársis, “informe e multiforme”, para lembrar aqui uma feliz expressão de Baudelaire.
A obra requer escuta ativa – atenta às sutilezas harmônicas, às variações de volume, às melodias de timbres –, participativa, porque o compositor parece compartilhar com o ouvinte o sentido de completude da obra. As invenções orquestrais e harmônicas, onipresentes, podem disfarçar uma rítmica quase imponderável, amétrica, atemporal. Podem ocultar uma condução melódica quase imperceptível, como um cantus firmus, mas subterrânea.
véus sobre cores, verdadeira incitação sinestésica, compõe um afresco sonoro de rica perspectiva, cujo ponto de fuga é o silêncio.
Oiliam Lanna
Compositor, Doutor em Linguística, professor da Escola de Música da UFMG.