Quadros de uma exposição (orquestração por Mignone)

Modest MUSSORGSKY

(1874 | Orquestração por Francisco Mignone)

Mussorgsky foi um dos mais talentosos compositores russos da segunda metade do século XIX. Nascido em uma família da antiga nobreza russa, iniciou seus estudos de piano aos seis anos de idade. Foi um homem de elevada cultura, curioso e sempre ávido por conhecimento, apesar de ter sido constantemente associado a uma imagem de boêmio e grosseiro. Em 1870 conheceu o jovem Victor Hartmann (1834-1873) que, além de pintor, era arquiteto, ilustrador, designer de joias, decorador, cenógrafo e figurinista. Do encontro surgiu uma amizade profunda entre ambos.

 

Apesar do imenso talento que possuíam, os dois jamais conheceram o sucesso em vida e viveram existências precárias. Hartmann produziu uma obra significativa em quantidade, mas da qual apenas uma pequena parte nos chegou. De suas mais de quatrocentas criações, sobrevivem hoje pouco mais de sessenta. Morreu precocemente em 1873. No ano seguinte, o crítico Vladimir Stassov e o conde Paul Suzor, dois de seus maiores admiradores, organizaram, na Associação dos Arquitetos de São Petersburgo, uma exposição com várias de suas obras. Mussorgsky a visitou inúmeras vezes e, no mesmo ano, compôs a suíte para piano Quadros de uma exposição, estruturada em quinze movimentos (dez quadros e cinco caminhadas). Os quadros são inspirados em desenhos, croquis e pinturas de Hartmann (das dez obras de Hartmann escolhidas por Mussorgsky, apenas seis podem ser encontradas atualmente; as outras se perderam), e as caminhadas (Promenades) representam o próprio Mussorgsky que caminha pela exposição. A suíte, finalizada em 22 de junho de 1874, só seria publicada postumamente, em 1886, com revisão de Rimsky-Korsakov.

 

Por causa da generosidade musical e tímbrica da suíte, inúmeros foram os que a utilizaram para arranjos e orquestrações as mais diversas, desde o regente Mikhail Tushmalov (1886) no final do século XIX, passando por Maurice Ravel (1922) e Leopold Stokowski (1938), até os dias de hoje, com o grupo de rock Emerson, Lake & Palmer (1971) e o pianista e regente Vladimir Ashkenazy (1980).

 

Pouco se sabe sobre a belíssima orquestração de Francisco Mignone para a suíte Quadros de uma exposição. Sua viúva, a pianista Maria Josephina Mignone, desconhecia a obra e parece tê-la encontrado apenas após a morte do marido, em 1986, perdida em uma gaveta. No entanto, acredita-se que tenha sido realizada no final da década de 1940, já que nos manuscritos das partes cavadas, atualmente na Biblioteca Nacional, verifica-se que ela foi executada em março de 1952 no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, assim como em 1953 no Sodre (Servicio Oficial de Difusión Radio Eléctrica), de Montevidéu, e em 1954 nas comemorações do quarto centenário da cidade de São Paulo. A orquestração de Mignone para Quadros de uma exposição é especial, extremamente fiel às indicações originais de Mussorgsky e das poucas que contempla a suíte completa (a versão de Ravel, mais conhecida, omite a quinta Promenade).

 

Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Música pela Unicamp, professor na Escola de Música da UEMG, autor dos livros Os sapatos floridos não voam e Música menor.

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