Johann Sebastian BACH
Instrumentação: cravo, cordas.
No início do século XVIII o termo concerto designava geralmente obras em três movimentos (rápido-lento-rápido) para um ou mais solistas e orquestra. O gênero, que se originou na Itália do século XVI e rapidamente se espalhou pela Europa, conheceu um desenvolvimento moderado até o aparecimento de Vivaldi, no início do século XVIII, que introduziu um vocabulário operístico em seus concertos, estabeleceu parâmetros de alto virtuosismo para os solistas e consolidou uma estrutura musical baseada na repetição (ritornello) de trechos orquestrais (tutti) entre episódios musicais dos solistas (concertino). Quando os concertos de Vivaldi chegaram à Alemanha, tornaram-se uma febre entre os compositores. Adaptando-se às características locais, acabaram por gerar um gênero híbrido, que mesclava, às preferências germânicas pelo rigor temático, o brilhantismo técnico italiano, sem deixar de lado certo sabor francês, proveniente da popularidade da música instrumental francesa nas cortes alemãs.
Os Concertos de Brandenburgo inserem-se nesse contexto. Trata-se de um conjunto de seis concertos sensivelmente diversos, tanto no âmbito instrumental como na concepção estrutural e estilística. Bach, que soube, como ninguém, assimilar a música do seu tempo, compôs uma espécie de síntese do gênero, um modelo, de altíssimo nível, das possibilidades estruturais e expressivas do concerto. Os Seis Concertos para vários instrumentos – compostos quando Bach trabalhava na corte de Köthen – acabaram por tornar-se conhecidos como Concertos de Brandenburgo graças ao hábito germânico de referir-se às obras pelo nome do dedicatário ou homenageado. De fato, foram dedicados não ao príncipe de Köthen, mas ao marquês de Brandenburgo-Schwedt, que Bach havia conhecido em Berlim. Na longa dedicatória escrita em francês, língua em vigor na corte de Berlim à época, o compositor deixa transparecer sua intenção de conseguir um posto a serviço do marquês, o que nunca se concretizou.
O Concerto nº 4 foi escrito para um violino e duas flautas como solistas (concertino) e uma orquestra (ripieno) de cordas e baixo contínuo. Embora seus três movimentos (rápido-lento-rápido) sejam típicos dos concertos italianos, sua densidade estrutural vai além das concepções vivaldianas. O primeiro movimento (Allegro), de sabor francês, possui escrita virtuosística para o violino solista (assim como o terceiro movimento), enquanto as flautas travam um diálogo extraordinariamente gracioso. No segundo movimento (Andante) o violino solista se junta ao ripieno para construir a base para o solo das flautas. O terceiro movimento (Presto) é um grande exemplo da feliz aliança entre a estrutura contrapontística germânica e o brilhantismo italiano.
Como o marquês não dispunha de orquestra tão grande, nem de músicos de tão alto nível, os Concertos não foram executados e acabaram na biblioteca do castelo. Descobertos mais de cem anos depois, em 1849, foram publicados no ano seguinte, nas celebrações do centenário da morte de Bach.
Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Música pela Unicamp, professor na Escola de Música da UEMG, autor dos livros Os sapatos floridos não voam e Música menor.