O Lago dos Cisnes, op. 20a

Piotr Ilitch TCHAIKOVSKY

(1875/1876)

 

Instrumentação: Piccolo, 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 4 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, cordas.

 

O enredo de O lago dos cisnes deriva de uma antiga lenda alemã.

Por obra do temível bruxo Rothbart, a princesa Odette e suas companheiras são transformadas em cisnes e só retomam a forma humana da meia-noite ao amanhecer. Durante uma caçada noturna, o príncipe Siegfried se apaixona por ela e planeja livrá-la do sortilégio, com uma declaração de eterno amor. Na noite seguinte, a princesa deverá apresentar-se no castelo onde, em grande festividade, o príncipe anunciará a todo o reino o noivado dos dois.

Entretanto, Rothbard impede o comparecimento da princesa à festa, substituindo-a por sua filha Odile, vestida de cisne negro e transfigurada em sósia da verdadeira princesa (tradicionalmente os dois papéis são interpretados pela mesma bailarina). Burlado pelo ardil de Rothbard, Siegfried declara-se ao cisne negro.

Percebendo seu engano, o príncipe volta ao lago para reencontrar Odette. Os dois apaixonados reafirmam seus sentimentos. Enfurecido diante de tão grande amor, Rothbard ordena ao lago que transborde. Para sempre transformadas em cisnes, as amigas da princesa fogem, enquanto os amantes, preferindo a morte à separação, desaparecem nas águas agitadas.

Para Tchaikovsky, a abordagem da composição musical era antes de tudo um gesto autobiográfico, confessional. Em cartas, ele se refere frequentemente ao Destino (o Fatum) como tema programático central para muitas de suas obras. Quanto a O lago dos cisnes – apesar dos obrigatórios números de danças típicas e divertissements –, o compositor buscou evidentemente um colorido dramático para a partitura.

A Cena inicial apresenta o tema do Destino no oboé, sobre o acompanhamento da harpa e o trêmulo das cordas. Esse tema será desenvolvido com grande dramaticidade pela orquestra, tornando-se um motivo condutor para a ação.

Uma escala descendente em pizzicato das cordas introduz a grande Valsa que abre as festividades no palácio de Siegfried. A rica orquestração valoriza os temas que refletem o entusiasmo dos convidados. Segue-se a Dança dos Cisnes, cuja melodia inicia-se pelo oboé. A curiosa instrumentação valoriza as madeiras, e o ritmo lembra um delicado minueto.

Na próxima cena, a introdução alterna acordes do oboé e do clarinete com os desenhos da harpa. Todo o movimento é dominado por um violino que acompanha o difícil solo de Odette, um dos mais célebres números coreográficos da história do balé.

As danças típicas finais são retiradas da festa de noivado do terceiro ato, quando convidados de vários países dançam seus ritmos característicos.

Independentemente das associações autobiográficas ou literárias de sua gênese, a obra de Tchaikovsky impõe-se por suas qualidades intrínsecas, sobretudo pela beleza melódica, pelo domínio magistral da orquestração e pela prodigiosa intuição do poder expressivo dos instrumentos. Com Tchaikovsky, o balé russo ganhou incomparável prestígio musical no final do século XIX e iniciou uma renovação estética que teve continuidade nas obras de compositores como Rimsky-Korsakov, Stravinsky e Prokofiev.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.

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