Edward ELGAR
A Inglaterra sempre se protegeu dos acontecimentos turbulentos da Europa, pelo fato de se encontrar geograficamente isolada do continente. As ideias costumavam perder força quando cruzavam o mar em direção à ilha, mas ganhavam em dinamismo quando a rota era em sentido contrário. A música era o único domínio capaz de contrariar essa lógica. Por séculos, a Inglaterra importou a música do continente, especialmente da Alemanha e, com a exceção de Henry Purcell, não conseguiu produzir outro compositor de reputação internacional. Quando, no século XIX, uma forte onda nacionalista assolou o continente, a sociedade inglesa permaneceu indiferente. Os movimentos nacionalistas da época visavam afirmar os valores musicais nacionais através do resgate das manifestações populares, principalmente da música folclórica. Curiosamente, desde o século XVIII, os compositores ingleses cultivavam o hábito de incorporar melodias folclóricas e pseudo-folclóricas à sua música, porém, sem muito sucesso entre o seu povo. O paradoxo do nacionalismo inglês estava no fato de que, ao mesmo tempo em que a invasão da música alemã era vista como uma ameaça à criatividade da nação, os longos séculos de importação musical condicionaram os ingleses a um preconceito sem precedentes com os compositores locais.
Elgar foi o primeiro compositor inglês a se tornar plenamente aceito em seu país, e internacionalmente reconhecido, após o vazio de mais de duzentos anos deixado pela morte de Purcell. Embora considerado um representante do nacionalismo inglês, sua música, curiosamente, não é minimamente influenciada pelo folclore, nem lança mão de técnicas composicionais derivadas da música popular. O que faz sua música soar tão inglesa talvez seja o grande domínio do espírito de seu país, uma mistura de respeito às tradições, conhecimento pleno do idioma e sólida capacidade técnica. Embora Wagner e Brahms tenham sido suas grandes influências, Elgar faz uma releitura de suas partituras como só um inglês seria capaz: “com nobreza”.
Edward William Elgar nasceu na pequena cidade de Broadheath, no condado de Worcester, no centro oeste da Inglaterra. Seu pai era afinador de pianos e proprietário de uma loja de artigos musicais. Como não podia frequentar a escola, Elgar estudou toda a música disponível na loja e, aos 16 anos, já trabalhava como violinista, organista, fagotista, regente e professor de música. Introdução e Allegro, uma de suas obras mais conhecidas, foi composta em 1905 para a então recém-fundada London Symphony Orchestra, que a estreou em 08 de março do mesmo ano, no Queen’s Hall, sob a regência do compositor. A formação curiosa, para quarteto de cordas e orquestra de cordas, invoca um gênero muito praticado no Barroco, o Concerto Grosso. Porém, enquanto no Concerto Grosso o grupo de solistas se encarrega de tocar os temas, e a orquestra cuida do acompanhamento, na obra de Elgar essa distinção inexiste: tanto temas quanto acompanhamento são conferidos a ambos. Introdução e Allegro, por sua complexidade musical e grande dificuldade técnica, demorou anos para ser plenamente aceita pelas orquestras. Somente após a Segunda Guerra Mundial a obra foi definitivamente incorporada ao repertório internacional.
Guilherme Nascimento
Doutor em Composição, professor de Música da UEMG e da Fundação de Educação Artística, autor do livro Música menor.