Sinfonia nº 88 em Sol maior

Franz Joseph HAYDN

(1787)

Instrumentação: flauta, 2 oboés, 2 fagotes, 2 trompas, 2 trompetes, tímpanos, cordas.

 

Haydn, um dos compositores essenciais da história da música, levou à plena maturidade os gêneros musicais associados à forma sonata clássica, na segunda metade do século XVIII. Sob esse aspecto, suas 104 sinfonias constituem um legado ímpar. Significativamente, o repertório atual de concerto, quando se volta para os primórdios do gênero, se fixa em suas três sinfonias – Le matin, Le soir, Le midi –, compostas em 1761. Essas pequenas sinfonias foram os primeiros trabalhos do músico para a família Esterházy, à qual serviu por quarenta anos, como regente e compositor. Confinado aos dois palácios de seus patrões, Haydn vivia em grande isolamento artístico. Por outro lado, com excelente orquestra à sua disposição, podia testar imediatamente suas originais experiências como compositor.

 

As “experiências” musicais de Haydn – em sua linha evolutiva por cerca de meio século — começam no estilo galante e culminam nos primórdios do Romantismo. Seu campo preferencial é o da música instrumental, onde sua linguagem desenvolve um trabalho intelectual detalhista e espirituoso. Nas primeiras sinfonias, faz uma síntese brilhante do Barroco e do Classicismo. Aos poucos, toma diferentes orientações. De 1766 até 1774 (época do movimento romântico Sturm und Drang), sua obra adquire um tom mais subjetivo. E, quando estabelece uma relação de amizade e admiração recíproca com Mozart, os dois gênios deixam-se influenciar mutuamente, apesar da diferença de idade e de temperamento.

 

Aos poucos, a fama de Haydn extrapolou os domínios dos Esterházy. Os patrões se sentiam orgulhosos dessa glória e quase a totalidade da produção final do compositor destinou-se aos grandes centros: Viena, Paris, Londres, Madri.

 

A Sinfonia nº 88, publicada em Paris, é uma obra vigorosa, um dos trabalhos mais audaciosos de Haydn. Após a introdução (Adagio), o Allegro inicial impressiona pela concentração temática, obtida a partir de um motivo breve, porém dotado de poderosa energia latente. No Largo em Ré maior o violoncelo apresenta uma bela melodia, com caráter de hino, que reaparecerá sete vezes em engenhosas variações de orquestração, contracantos e tonalidades. Os trompetes e a percussão, até então silenciosos no primeiro movimento, fazem aqui expressivas intervenções. O Minueto (Allegretto) é transfigurado em uma vigorosa dança camponesa. O caráter rústico é evidenciado no Trio, com os peculiares efeitos de gaita de foles obtidos nas notas sustentadas pelas trompas e fagotes. O Finale (Allegro con spirito) é um grande rondó sinfônico. Surpresas rítmicas e elementos populares de contagiante alegria se aliam à alta ciência do contraponto. No desenvolvimento central, violas, violoncelos e contrabaixos começam uma versão do tema e logo são “perseguidos” pelos violinos, à distância de meio compasso, em idêntica melodia. Com esse cânone, Haydn atinge um dos grandes e inesquecíveis momentos da sinfonia clássica vienense.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado.

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