Robert SCHUMANN
(1841)
No dia 12 de setembro de 1840, Robert Schumann casava-se com a filha de seu ex-professor, a pianista Clara Wieck. Sustentar uma família era tarefa árdua para um compositor desconhecido, tão árdua que Clara precisou lecionar e dar inúmeros concertos para ajudar a família, enquanto Robert perseguia a carreira de compositor. Embora suas primeiras composições tenham sido bem recebidas, ele logo percebeu que, para tornar-se um compositor de prestígio, era necessário ser bem-sucedido na composição de obras de grande porte, tais como a ópera ou a sinfonia.
Schumann tinha apenas trinta anos e essa era uma das fases mais felizes de sua vida: acabava de se casar com aquela a quem já amava desde muito jovem e experimentava uma explosão de criatividade sem precedentes. Compôs sua Primeira Sinfonia em apenas quatro dias, no mês de janeiro de 1841. Schumann trabalhava de noite e raramente conseguia algumas horas de sono. Pronta a orquestração no final de fevereiro, em 6 de março ele decidiu levar a partitura para Felix Mendelssohn, então diretor musical da Orquestra Gewandhaus de Leipzig. Mendelssohn, a maior autoridade musical da cidade na época, ficou tão encantado com a sinfonia que decidiu logo programá-la. A estreia se deu no dia 31 de março. Em dois meses a sinfonia havia sido composta, orquestrada e estreada com sucesso.
Esse concerto foi, segundo Schumann, um dos eventos mais importantes de sua vida. Até aquele momento, ele não se experimentara fora da composição para piano e do Lied. Com a Primeira Sinfonia, Schumann, beethoveniano convicto, tentava dar vida às suas ideias sobre a música. Para ele, era imperativo que os compositores do presente não apenas buscassem apoio na música do passado, mas que revelassem novas belezas artísticas. Entretanto, para toda aquela geração de compositores, incluindo o próprio Schumann, colocava-se a questão de como ser capaz de compor sinfonias após as grandiosas conquistas de Beethoven. A proposta de Schumann foi aliar o ritmo obstinado, presente em algumas sinfonias de Beethoven, ao lirismo contemplativo de Schubert. Criou um estilo novo para si e pavimentou o caminho para suas próximas conquistas.
A inspiração para a composição da Sinfonia no 1 partiu da poesia de Adoph Böttger, poeta de Leipzig e amigo do compositor. No início, além do título de “Primavera”, a Sinfonia continha subtítulos para cada movimento, mas Schumann decidiu removê-los antes da publicação, para evitar que eles norteassem as futuras interpretações. No entanto, rever os subtítulos nos ajuda a compreender muito da obra. O primeiro movimento (Andante, un poco maestoso – Allegro molto vivace) era intitulado “Despertar da primavera”. Inicia-se com uma lenta introdução, que acelera até desembocar em um Allegro exuberante e cheio de vivacidade. O segundo movimento (Larghetto), originalmente intitulado “Noite”, é uma criação tipicamente schumanniana, com sua atmosfera de sonho, serena e repleta de doçura. Sem pausa, somos levados ao terceiro movimento (Molto vivace), um Scherzo de construção complexa, com seus dois Trios e, ao final, o retorno da primeira seção. Seu caráter festivo se assemelha muito ao título original: “Alegres companheiros”. O quarto movimento (Allegro animato e grazioso), que recebera o título de “Em plena primavera”, é irresistivelmente alegre, vivaz, com uma conclusão radiante. Certamente, uma das obras mais espontâneas de Schumann.
Guilherme Nascimento
Compositor, Doutor em Música pela Unicamp, professor da UEMG e da FEA, autor dos livros Os sapatos floridos não voam e Música menor.