Claude DEBUSSY
(1890/1922)
Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 2 trompas, 2 trompetes, tímpanos, percussão, harpa, cordas.
O importante prêmio francês Prix de Rome garantia uma residência para aperfeiçoamento na Villa Medici, em Roma, para destacados artistas. Por duas vezes Debussy pleiteou o prêmio. Em 1883 perdeu para Paul Vidal, no ano seguinte venceu com a obra L’Enfant prodigue. Partindo em 1885 para a Villa Medici, ali permanece por dois anos. Não se adapta com facilidade à mudança. Novos hábitos e a paixão por Marie Vasnier confundem o compositor, que só após um semestre consegue voltar-se para o trabalho. Durante a estada em Roma, Debussy conheceu Franz Liszt – que visitou a Villa Medici –, descobriu as Missas de Palestrina e Orlando de Lassus, autores que marcaram sua linguagem tardia, e assistiu à ópera Aida, de Verdi. Logo ao deixar Roma, ouviu Tristão e Isolda, de Richard Wagner, ópera pela qual se declarou fascinado.
É à música vocal que Debussy dedica prioriariamente seus primeiros anos de produção musical: canções, cenas líricas e obras com coro. Só em 1890 passa a compor intensamente para o piano. O início de sua produção pianística solo é marcado pela predominância de dois gêneros musicais: as baladas, inspiradas nas canções – reafirmando a admiração pela voz; e as danças – que unem as formas antigas ao exotismo e cosmopolitismo revelados pela Exposition Universelle de 1889, em Paris. Em 1890 Debussy compôs para o piano a Rêverie, a Valse romantique e o par Tarantelle styrienne e Ballade slave. Também iniciou a composição da Mazurca, das duas Arabesques e da Suite Bergamasque.
Frequentemente subestimadas, as primeiras composições pianísticas de Debussy sintetizam as influências de seu período de formação. Revestidas de arcaísmos jocosos e irônicos, revelam um Neoclassicismo perspicaz. Nota-se nessa fase a influência dos grandes melodistas franceses: Massenet, Delibes, Chabrier e Fauré, além da forte presença do Simbolismo francês, que lhe inspirou o tratamento dramático das harmonias a partir de sugestões sinestésicas.
A Tarantelle styrienne é uma obra híbrida, na qual Debussy joga com dois gêneros de dança: a típica tarantela italiana e a valsa vienense. Faz os apoios da música oscilarem entre os compassos binário composto, característico da tarantela, e ternário simples, próprio da valsa. Assim, escuta-se uma dança singular que se desloca entre a Itália e a Styria, região da Áustria marcada pela cultura eslava. Em 1903 a obra foi republicada como Danse. A peça antecipa as translúcidas e leves harmonias recorrentes em Debussy, e sua seção central sugere as fêtes galantes do pintor Watteau, charmosas cenas banhadas na teatralidade da commedia dell’arte.
A mesma Exposition Universelle que despertou o cosmopolitismo de Debussy suscitou em Maurice Ravel, aos 14 anos, a predileção pela orquestração. Ravel – que viria a tornar-se o maior orquestrador francês – deslumbrara-se ao ouvir as obras russas regidas por Rimsky-Korsakov, compositor e orquestrador excepcional. Arguto e sofisticado, Ravel extrai da orquestra criativas combinações de timbres, libertando os instrumentos de seus usos ordinários. Em 1922 Ravel orquestra Danse, em homenagem a Debussy. Faz emergir com seu colorido os contornos e toda a diáfana estrutura das primeiras obras que o próprio Debussy descreve como “perfeitas em forma, refinadas segundo as mais simples essências, ainda que exuberantemente desenvolvidas, completas”.
Igor Reyner
Pianista, Mestre em Música pela Universidade Federal de Minas Gerais.